Anunciada durante a COP28, em Dubai (Emirados Árabes), a Aliança para Resiliência e Clima dos Oceanos (ORCA) é uma iniciativa que reúne alguns dos principais financiadores filantrópicos do mundo em torno de um objetivo comum: identificar e financiar soluções climáticas oceânicas para mitigação, sequestro, adaptação e resiliência, por meio de um fundo de US$ 250 milhões.
O anúncio, feito no dia 2 de dezembro, contou com a presença do enviado especial do secretário-geral da ONU para o Oceano, Peter Thomson; o CEO da Bloomberg Philanthropies, Patti Harris; o presidente e diretor da Woods Hole Oceanographic Institution, Peter de Menocal; e a diretora do Scripps Institution of Oceanography da UC San Diego, Margaret Leinen.
Com um compromisso inicial de R$ 250 milhões, o fundo ORCA propõe uma parceria entre entidades filantrópicas, organizações sem fins lucrativos, comunidades locais e povos indígenas ao redor do mundo para proteger os ecossistemas oceânicos e as comunidades costeiras, ambos afetados por problemas derivados do aquecimento global.
“O que é impressionante no anúncio, na minha opinião, é a união de filantropos e fundações para apoiar um número relativamente pequeno de pesquisas sobre soluções climáticas baseadas nos oceanos, com uma grande quantidade de dinheiro. É que chamamos de capital catalítico, que garante que pesquisas urgentes sejam conduzidas”, comentou Peter de Menocal ao Um Só Planeta sobre o fundo.
Os financiadores incluem Ballmer Group, Bloomberg Philanthropies, Builders Vision, David and Lucile Packard Foundation, Gordon and Betty Moore Foundation, Jeremy and Hannelore Grantham Environmental Trust, Oak Foundation, Oceankind, Paul M. Angell Family Foundation, Rivian Foundation, Rockefeller Brothers Fund e Vere Initiatives.
O capital catalítico, segundo Peter de Menocal, fornece recursos em escala que também permitem que cientistas e formuladores de políticas busquem o que se chama de ciência e pesquisa de alto risco e alta recompensa.
“É o tipo de pesquisa que é difícil de obter financiamento por meio de canais federais ou governamentais, mas é essa pesquisa urgente que vai informar as soluções. O pano de fundo por trás disso é que precisamos de soluções climáticas em grande escala dentro de uma década. Para conseguir isso é necessária uma nova maneira de fazer ciência e uma nova maneira de fazer política, e uma dessas novas formas é a filantropia transformadora realmente significativa a ser aplicada a esses tipos de problemas”, explica.
O investimento inicial do fundo será destinado a sete áreas ao longo de um período de cinco anos: aumentar a energia eólica offshore (no mar); descarbonizar a indústria naval; proteger o Ártico; reforçar a diplomacia oceânica estratégica para a agenda oceânica e climática; ampliar a ação liderada por comunidades no Sul global; promover a pesquisa sobre carbono oceânico; e expandir a restauração e conservação de habitat para aumentar a captura de carbono nos oceanos.
Essas prioridades foram elencadas em consulta com a comunidade de doadores para os oceanos e o clima e aperfeiçoadas em colaboração com potenciais beneficiários do fundo - a lista completa dos selecionados será publicada no início de 2024.
O oceano é um dos maiores aliados na batalha contra as alterações climáticas. Estudos mostram que as intervenções baseadas nos oceanos podem ser responsáveis por quase metade das soluções de carbono necessárias para manter o aquecimento global abaixo dos 2 ºC, que também é fundamental para proteger o bem-estar das quase 1,4 bilhões de pessoas que vivem em zonas costeiras e baixas ao redor do mundo.
Apesar da relevância dos oceanos nas discussões e ações climáticas, o financiamento para a mitigação climática representa apenas 2% do total das doações filantrópicas, enquanto que a conservação dos oceanos recebe menos de 1%. Já o financiamento na intersecção entre oceano e clima soma, no total, menos de um centésimo de 1% do total das doações filantrópicas.
Um dos motivos para que os oceanos não estejam na lista de prioridades humanas, segundo o diretor, é porque, em um nível muito simples, nós somos uma espécie terrestre. O problema é que a terra representa apenas cerca de 29% da superfície do globo. “O grande desafio para a questão climática é escalonar, e a parte mais promissora do planeta que nos permite escalonar é o oceano. Por isso que precisamos fazer esse trabalho com tanta urgência, porque o oceano é tão grande, tão vasto e é muito sub-observado em relação à densidade de observações e instrumentos que temos em terra.”
O financiamento em pesquisa é fundamental para aumentar o conhecimento sobre os oceanos e entender as soluções que precisam ser implementadas a partir de políticas.
“Por trás de cada aplicação bem-sucedida de política ambiental, existe uma base de ciência de ponta”, afirma Peter, citando exemplos de desafios globais que foram abordados a partir de estudos, como o caso da destruição de camada de ozônio. “O que é importante sobre a ciência é que ela define os limites do problema, vincula os atores e aponta soluções, permitindo que se desenvolva soluções seguras e equitativas enraizadas na ciência, e não na conveniência ou na indústria. Por meio da pesquisa independente, como a que fazemos no Woods Hole Oceanographic Institution, você tem certeza de que está obtendo a melhor ciência possível, sendo entregue da maneira mais rápida possível”, argumenta o diretor.
Uma das iniciativas na qual a organização está trabalhando é o desenvolvimento de uma forma de observar o oceano no momento e na escala espacial em que seus fenômenos se manifestam. Para isso, é necessário um sistema equivalente à rede de satélites que cobre o planeta, o que eles estão chamando de Rede de Sinais Vitais do Oceano. É como se fosse uma internet oceânica, que vai permitir o monitoramento da saúde dos mares e os sinais vitais sobre as coisas com as quais as pessoas se preocupam nas águas marinhas - como peixes, poluição, plásticos, energia eólica offfshore, mineração.
Do outro lado da tecnologia e ciência está a construção de uma comunidade de pesquisadores e formuladores de políticas. Na COP, o diretor participou de um encontro com outras grandes instituições oceanográficas para convidá-los a participar da rede.
“Tudo o que nos interessa volta ao oceano ou tem origem no oceano. Quando pensamos na ação climática e no seu impacto nas pessoas, temos de pensar na ação oceânica", diz Peter. Ele cita que as comunidades costeiras, a economia dessas cidades urbanas costeiras estão conectadas com o aumento do nível do mar, o aquecimento dos oceanos e a intensidade das tempestades. "Se não conseguirmos controlar as formas de reduzir as emissões, então não seremos capazes de parar esta dor extrema que atingirá a sociedade global”, finalizou Peter, em resposta ao meu pedido de mensagem para os líderes mundiais que estão aqui na COP decidindo o presente e o futuro da humanidade na Terra.
Esta história foi produzida como parte da Climate Change Media Partnership 2023, uma bolsa de jornalismo organizada pela Earth Journalism Network da Internews e pelo Stanley Center for Peace and Security.