Por Profissão Repórter


Comissões dentro de universidades ajudam a impedir fraudes nas cotas raciais: 'Temos casos de má-fé'

Comissões dentro de universidades ajudam a impedir fraudes nas cotas raciais: 'Temos casos de má-fé'

A Lei de Cotas, que garante 50% das vagas em universidades federais do país para estudantes que cursaram o Ensino Médio nas escolas públicas, está completando 10 anos. Mas iniciativas como a ONG Educafro, criada para promover a inclusão da população negra e pobre nas universidades do país - públicas e particulares - também colaboraram muito para o aumento de estudantes negros no ensino superior.

O Profissão Repórter foi até a sede da instituição, no Centro de São Paulo, para conversar com seu fundador, o Frei David Santos, teólogo e filósofo, que contou um pouco de sua história e falou sobre os resultados de sua luta.

“Lá atrás, em um certo momento da minha história, quando eu entrei para ser frade franciscano, eu não assumia minha negritude. Eu era um branco que, para mim, era apenas queimado de sol. Aí eu sofri um racismo e, a partir dali, eu decidi que eu só seria frade se fosse para dedicar toda a minha vida nessa causa. Já faz mais de 50 anos. A cota vem, justamente, confrontar e enfrentar o racismo e, graças a Deus, estamos conseguindo isso”, contou.

Devido a seu ativismo em relação à cotas, hoje Frei David é uma referência e dá treinamentos. Nossa equipe foi em um deles, na Universidade Federal de Rondonópolis, em Mato Grosso, para falar sobre a questão das possíveis fraudes envolvendo as cotas raciais e mostrar como funciona a Comissão de Heteroidentificação de uma instituição, grupo de pessoas treinadas para bancas que têm como objetivo verificar se quem se declarou negro, realmente é.

“Nós queremos que essa universidade que está nascendo seja uma referência no combate ao racismo e que os pouquíssimos, mas importantes, casos de fraudes nas cotas raciais que nós temos sejam os primeiros e os últimos”, afirmou Priscila Scudder, coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas.

Junto com Frei David, o procurador do Ministério Público Federal Onésio Soares Amaral também liderou o treinamento (veja como funciona o processo no vídeo acima), e falou sobre os principais desafios desse trabalho.

“A grande dificuldade nossa, muitas vezes, é com o pardo. Pardo no Brasil é aquela pessoa que, tendo a pele mais clara, continua tendo traços negroides no cabelo, no formato dos lábios mais grossos, na base alargada do nariz, no seu conjunto. Portanto, é aquele negro de pele clara, de um modo mais direto. Em muitos casos, temos casos de má-fé. São pessoas absolutamente brancas, que seriam brancas até mesmo na Europa ou no Rio Grande do Sul, e as pessoas, de modo bastante abusivo, declaram-se pardas”, explicou.

Após acompanhar todo o processo, o repórter Guilherme Belarmino foi conversar com estudantes de psicologia sobre as cotas, e acabou descobrindo um caso polêmico: uma estudante do curso de Psicologia, de pele branca, que entrou através das cotas e se autodeclarou parda. Ao ser questionada, ela pediu para não ser identificada e ponderou:

“Falar que eu sofri no mesmo nível que elas é a pura hipocrisia da minha vida. Não vou falar que sofri a minha vida inteira. Não. Teve as piadinhas por causa do cabelo, porque ele é bem cacheado, é armado e tal. Mas falar que eu sofri a mesma quantidade que elas é uma hipocrisia que não tem tamanho”.

A autodeclação da aluna foi aprovada pela comissão, mas a decisão foi questionada por outros estudantes e denunciada à reitoria da universidade. Agora, ela está sendo reavaliada. A reitora Analy Castilho Polizel garante:

“Se um estudante entrou na universidade de forma errada, ele vai ser retirado para que aquela vaga seja ocupada por quem tem direito, faz jus à vaga”.

  • Assista ao programa completo abaixo:

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