UX e Neuromarketing: Como a ciência pode ajudar nas pesquisas de mercado?

Há diferença entre o que as pessoas dizem e o que realmente fazem. Entenda técnicas para entender como usuários pensam.

Laís Fernandes
UX Collective 🇧🇷

--

Na imagem vemos uma tela de um computador de mesa mostrando uma página de compra da Amazon Store. Na tela, vemos a página de uma máquina fotográfica que está a venda e, sobre ela, um mapa de calor e uma análise das emoções geradas em um experimento cerebral.

O neuromarketing é uma ferramenta de pesquisa que surge da convergência entre o marketing e a neurociência. Seu objetivo é a interpretação dos pensamentos, sentimentos, necessidades e desejos do ser humano por meio de respostas cerebrais.

Mas como essa ciência pode ajudar nas pesquisas de mercado? Nesse artigo vou compartilhar como as técnicas de neuromarketing são extensamente usadas para desenhar estratégias de mercado, se apoiando na percepção inconsciente do usuário com as soluções digitais.

Do marketing ao neuromarketing

Medir a experiência do usuário é um grande desafio e o objetivo central de pesquisas em UX. E, para isso, são normalmente utilizadas pesquisas qualitativas e quantitativas. Mas elas são realmente eficazes?

Muitos fundamentos do marketing tradicional que funcionaram no passado já não representam a mesma eficiência quando aplicados no contexto atual.

Define-se Marketing como um conjunto de atividades inter relacionadas entre si, que tendem a satisfazer a demanda do mercado. Mas, defini-lo como um processo cuja finalidade é satisfazer as necessidades não corresponde muito bem com a realidade, já que os usuários não têm total conhecimento do que realmente necessitam.

“Há uma diferença entre o que as pessoas dizem que fazem e o que realmente fazem.”

— Buyology

As tradicionais técnicas de investigação são consideradas limitadas, uma vez que invadem o espaço vital das pessoas usuárias, fazendo-as ocultar ou até mesmo mentir sobre suas verdadeiras respostas, desejos e necessidades.

Ainda no livro Buyology, Martin Lindstrom afirma:

“A investigação de mercados ou grupos focais já não serviam para averiguar o que pensam em realidade os consumidores. Isso se deve ao fato de que nossa mente irracional, cheia de preconceitos culturais enraizados na tradição e educação, além de uma série de fatores subconscientes, exerce uma influência poderosa, mas velada, sob nossas decisões.”

A evolução da neurociência proporcionou diferentes ferramentas que ajudam a visualizar o interior do cérebro, facilitando uma compreensão detalhada da complexidade desse órgão. E é por meio dessas novas ferramentas que se torna possível saber os segredos mais profundos do cérebro e desvendar suas verdades, sem censura.

O neuromarketing surge exatamente como uma ferramenta para suprir a limitação das pesquisas tradicionais. Utilizando uma análise implícita de reações fisiológicas e neurofisiológicas, a partir de equipamentos capazes de mensurar respostas inconscientes, é possível avaliar parâmetros biológicos e neurobiológicos da interação entre usuário e soluções digitais.

Mas o neuromarketing não marca o fim do marketing. Essa disciplina surge como uma contribuição para a nova maneira de fazer marketing na era digital.

Se analisarmos o neuromarketing combinado com as estratégias tradicionais de investigação de mercado, o resultado que se obtêm pode ser considerado o futuro do marketing e a chave para compreender verdadeira e totalmente os pensamentos, sentimentos, necessidades e desejos dos consumidores e de todos os seres humanos.

Ainda que considerada uma ciência jovem, limitada mas crescente no seu entendimento, o neuromarketing rompe barreiras e permite um conhecimento cada vez melhor da mente inconsciente e do comportamento do usuário.

As ferramentas do neuromarketing

Essa metodologia de investigação permite medir diferentes conceitos, como nível de atenção, ativação ou o estado emocional da pessoa usuária. Através das ferramentas de biometria disponíveis, é possível conhecer as respostas dos usuários em relação à diferentes estímulos.

Se a tecnologia permitiu a humanidade explorar o mundo, agora ela se submerge em novos territórios, permitindo descobrir a complexidade do cérebro humano.

Conhecendo as ferramentas

1. Eletroencefalografia — EEG

Mais conhecida como EEG, essa ferramenta é uma das mais utilizadas em neuromarketing, considerando seu baixo custo e sua simplicidade de execução.

Por meio de eletrodos distribuídos pela cabeça, é possível pode medir pequenas distorções elétricas para saber quais zonas do cérebro estão mais ativas.

Considerada uma técnica não invasiva, a EEG mede as variações elétricas do cérebro em tempo real e interpreta os sinais, relacionando-os com atenção e foco.

2. Eyetracking

O segmento ocular é um tipo de medição biométrica que ajuda a compreender o inconsciente do cérebro. Uma câmera de alta velocidade rastreia o movimento ocular, a dilatação da pupila e o piscar de olhos da pessoa usuária.

Com essa informação coletada, é possível identificar a rota visual, criar um mapa de calor que sinaliza os lugares onde a vista se deteve por mais tempo, além de indicar a trajetória por ordem onde os elementos foram examinados.

O Eyetracking é uma técnica minimamente invasiva e muito utilizada para análise de estratégias de marketing.

Na imagem vemos três linhas e cinco colunas de diferentes embalagens de sorvete. Sobre a imagem, temos manchas verdes, amarelas e vermelhas, que representam um mapa de calor resultado do Eyetracking.
Mapa de calor através de Eyetracking
Na imagem vemos três linhas e cinco colunas de diferentes embalagens de sorvete. Sobre a imagem, temos círculos amarelos com números pretos dentro, que representam um mapa por ordem de observação através de Eyetracking.
Mapa por ordem de observação através de Eyetracking
Na imagem vemos três linhas e cinco colunas de diferentes embalagens de sorvete. Sobre a imagem, temos manchas escuras que representam um mapa de opacidade através de Eyetracking, mostrando o que foi mais observado ali.
Mapa de opacidade através de Eyetracking

3. Mousetracking

É uma técnica complementar ao Eyetracking que responde ao recorrido da navegação do usuário através do mouse.

4. Resposta Galvânica da Pele — GSR

O GSR mede a atividade elétrica das glândulas que produzem suor nas palmas das mãos e pontas dos dedos, mais sensíveis às emoções e pensamentos.

5. Facial Coding

É uma técnica de reconhecimento facial.

Por meio de uma webcam e um software instalado no computador é possível analisar as mudanças de expressão facial no rosto das pessoas entrevistadas, uma vez que são submetidas a diferentes estímulos.

Também é uma técnica não invasiva e é normalmente realizada com as demais já citadas, já que possui pouca entidade.

Na imagem vemos uma tela de um laptop com um recorte de um anúncio publicitário. Nesse frame aparece uma mulher sentada em uma poltrona vermelha, com uma expressão positiva de surpresa. Sobre a imagem vemos um mapa de calor, que identifica as regiões do vídeo que a pessoa usuária passou mais tempo observando e um gráfico que identifica as principais emoções geradas ali.
Mapa de calor com linha do tempo de emoção através de Facial Coding
Na imagem vemos uma tela de um laptop com um gráfico, representando as estatísticas de diferentes emoções geradas por um anúncio publicitário, que aparece no canto superior direito da tela. O gráfico contempla 8 emoções distintas e cada uma delas é presentada por uma cor diferente.
Estatísticas de emoção através de Facial Coding
Na imagem vemos uma tela de um laptop com um gráfico, contendo uma timeline de um vídeo publicitário e uma análise do envolvimento emocional da pessoa usuária que assitiu o vídeo. O fundo do gráfico é branco e a linha do gráfico é representada na cor azul.
Envolvimento emocional através de Facial Coding

Quanto ao software para compilar os resultados, existem algumas opções — como o CoolTool, desenvolvidas exclusivamente para investigações e pesquisas de mercado. Através de uma plataforma online, essas ferramentas disponibilizam uma série de dados, informes automatizados e diferentes soluções para visualização.

Com todas essas ferramentas disponíveis e um software que integra todos os processos, é possível gerar conclusões de altíssimo valor, que falam e definem desejos, sensações e sentimentos das pessoas usuárias.

Neuromarketing na prática

Em 2018 tive a oportunidade de participar de um grupo de iniciação científica da Universidade Politécnica de Valência, durante minha pós-graduação em Marketing e Comunicação Empresarial.

Durante 6 meses de pesquisa, trabalhei em um laboratório completo, com tecnologias e softwares avançados, sendo parte da frente de investigação aplicada em neuromarketing.

Nesse período também participei de diversas pesquisas de mercado, tanto na perspectiva do negócio quanto da pessoa usuária. E dentre todos os experimentos que fizemos, teve um em especial, que gostaria de compartilhar:

Estávamos vivendo a Copa do Mundo e aproveitamos o momento para entender as diferentes emoções geradas por esse evento. A Copa é, sem dúvida, um dos eventos esportivos mais emocionantes, que une diferentes nações durante 1 mês, a cada quatro anos.

Durante essa época, as marcas buscam se destacar em um mar de anúncios, num espaço mais competitivo e mais saturado do que nunca. Nesse ambiente só os melhores ganham destaque e, esse é o caso, como de costume, da Nike, que constantemente desenvolve campanhas que permanecem na memória coletiva dos consumidores durante muitos e muitos anos.

O vídeo a seguir reforça exatamente isso:

Nesse experimento, medimos a efetividade do anúncio com uma pessoa usuária do país específico — nesse caso, eu!

O que uma pessoa brasileira sente ao ver a publicidade? Além de se emocionar com o anúncio, ela lembra a marca que há por trás de toda a construção?

O anúncio foi uma montanha-russa de emoções. Ao terminar de assistir, respondi rapidamente, quase sem pensar e com a naturalidade de quem aponta algo óbvio, que o anúncio era da Nike. Isso se deve ao fato de, além de conectar muito bem a história com os valores da marca, o vídeo transmite a essência pura do futebol brasileiro, através da fotografia, da ambientação sonora, dos personagens e do discurso motivador do menino com a camiseta do Brasil — a famosa canarinha.

Não sabemos se a Nike utiliza técnicas de neuromarketing para elaborar seus anúncios, mas está nítido que a empresa domina a habilidade de gerar uma curva de emoções memoráveis, aproveitando o momento certo e de maior engajamento para criar consciência da sua marca.

Conclusão

Assim como o UX, a neurociência vem apresentando um papel importante na atualidade. O novo milênio trouxe grandes avanços nas ferramentas de investigação e aplicações na neurociência, além de coroar o neuromarketing como um novo campo para investigação de mercados.

O estudo da dinâmica de respostas inconscientes dos usuários aos estímulos de marketing está só começando. O crescimento do neuromarketing continua de maneira progressiva e positiva para o mundo marqueteiro.

Pouco a pouco o valor agregado a essa ciência se difundirá até as pequenas e médias empresas e estará cada vez mais ao alcance de todos e todas.

O neuromarketing, na minha visão, tem um futuro prometedor, uma vez que explora a fundo a real necessidade, desejo e dor do usuário.

Mas, e para você? Deixe seu comentário e vamos conversar sobre! :)

Referências

  1. Lindstrom, Martin. (2008). Buyology: verdades y mentiras de por qué compramos. Booket.
  2. Viosca, José. (2017). El Cerebro: descifrar y potenciar nuestro órgano más complejo . National Geographic.
  3. Braidot, Néstor. (2013). Neuromarketing en acción: ¿Por qué los clientes te engañan con otros si dicen que gustan de ti?. Buenos Aires, Argentina: Ediciones Granica S.A.
  4. Keller, Kelvin L,; Machado, Marcos. (2008). Gestão Estratégica de marcas. Nova Iorque, Estados Unidos: Pretice Hall.
  5. MACOM UPV: Máster en Neuromarketing aplicado

--

--