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A newsletter desse mês não foi escrita por mim, eu apenas a organizei. Digo isso porque as palavras abaixo não são de minha autoria. São trechos de uns dos melhores livros que já li: “O mundo mais bonito que nossos corações sabem ser possível”, do economista americano Charles Eisenstein.

De todos livros que li (não contando romances/ficção), acredito que ele está no top 3. Sei que é muito difícil ranquear coisas tão subjetivas como livros, mas tentei achar uma posição pra esse só para vocês terem uma noção de quanto gostei (e incentivar vocês a lerem o texto até o fim).

Acredito que os trechos que separei são bem autoexplicativos, mas lembrem-se que existem várias páginas separando cada um deles, então, 1) não esperem uma leitura tão linear e 2) cada opinião dele tem muito mais profundidade dentro do livro. Logo, se algo chamar a atenção de vocês, não deixem de buscar o livro e ler as ideias dele em sua completude.

O livro tem versão em português e custa cerca de 50 mangos na Estante Virtual. JURO que não é um livre tilelê. Tá, é um pouco, mas bem pouco. Confia em mim :)


Antes de começar, só queria dar um rápido contexto para ajudar vocês a entender melhor esses trechos. O autor acredita que a sociedade de hoje está imersa no que ele chama de História da Separação (ou Velha História), uma narrativa que diz que nós todos (humanos, animais e tudo que existe na Terra) somos seres separados, independentes, e que nossas atitudes diárias levam a sociedade a ficar cada vez mais individualizada. Por consequência, vivemos uma crise climática, nunca fomos tão sozinhos e depressivos, nos desconectamos da natureza e do senso de comunidade. Partindo desse cenário, o que ele propõe é a História do Interser (ou Nova História), uma narrativa onde a gente se entende como seres interdependentes, e por saber que cada ação nossa importa para todo o resto da vida na Terra, agimos de forma a criar um mundo muito melhor do que temos hoje. 

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“Vemos com frequência dentro de organizações ambientais, dentro dos grupos políticos de esquerda, a mesma intimidação de subordinados, as mesmas disputas de poder, as mesmas rivalidades egóicas que vemos em qualquer outro lugar. Se isto acontece em nossas organizações, como podemos esperar que não acontecerá no mundo que criaremos, se formos vitoriosos?”

“‘Certamente, a inclusão dos marginalizados, a exposição dos preconceitos raciais e de classe, as habilidades de comunicação não-violenta, de escuta profunda, e outras nessa linha, são metas louváveis, mas nós estamos falando da sobrevivência da nossa espécie! Precisamos alcançar a redução de CO2 por qualquer meio necessário. Assim, dedicar-se a essas coisas, ou mesmo à maioria dos problemas sociais, é um pouco fútil.’ Essa visão acredita em outra versão da História da Separação, uma na qual o universo é constituído por um grande número de fenômenos independentes.”

“Qual a verdadeira causa da mudança climática? Emissões de CO2 e de outros gases do efeito estufa, talvez? Ok, qual a causa dessas emissões? Talvez o consumismo, a arrogância tecnológica, a necessidade de crescimento imposta pelo sistema financeiro. E quais as causas desses fatores? Em última análise, são as ideologias profundas que governam nosso mundo, a mitologia que define nossa civilização, que eu tenho chamado de História da Separação. As emissões de dióxido de carbono não vão mudar a menos que tudo que as alimenta também mude.”


“Quando o dinheiro é o objetivo, tudo o que não pode ser traduzido em números é ignorado.”

“Devemos nos orientar olhando mais para o lugar de onde nossas escolhas vêm do que para onde elas vão.”

“‘De verdade quero atuar com permacultura, é isso que eu amo, mas eu não deveria ter a responsabilidade de fazer algo maior que isso?’ Eu respondo que essa escolha só é pequena através dos olhos da Separação. Do ponto de vista do Interser, sua escolha não é mais nem menos importante do que qualquer escolha do presidente do país.”

“Não abandonaremos a razão em favor do sentimento; as telecomunicações em favor do abraço; a linguagem simbólica em favor da canção ou o dinheiro em favor da dádiva. Em cada um desses casos, porém, o primeiro conceito excedeu seu próprio domínio e usurpou o segundo. A Nova História inclui a antiga. Buscar a eliminação do antigo é, em si, um pensamento que pertence à Velha História.”

“Infelizmente, a espiritualidade típica como nós a conhecemos é, ela própria, uma componente-chave da separação.” (Só explicando: aqui ele fala que não faz sentido olharmos para espírito e corpo como coisas separadas)

“Sem um trabalho profundo sobre si mesmo, como você evitará recriar a opressão internalizada em você nas coisas que você faz?”

“Um ancião Dogon, quando perguntado ‘Você não sente a urgência de fazer algo a respeito (deflorestamento, mudanças climáticas, etc)?’, respondeu: ‘Você não compreendeu. Urgência é algo que já temos.’”

“É tentador pensar que existe a correria boa (para salvar o planeta) e a correria ruim (usar máquinas para fazer as coisas com menos trabalho); mas talvez o problema seja a mentalidade por trás dos dois tipos de correria. Essa mentalidade é um dos hábitos da Separação.”

“Em geral, as pessoas não conseguem sustentar uma história nova sozinhas.”

“Nem a riqueza nos põe a salvo da percepção de escassez. Uma pesquisa de 2011 sobre os super ricos realizada pelo Center Wealth and Philantropy do Boston College, estudou as atitudes diante da riqueza entre famílias com patrimônio de 25 milhões de dólares ou mais (algumas muito mais - a média era de 78 milhões). De forma surpreendente, ao responder se elas sentiam segurança financeira, a maioria disse que não. Quanto seria necessário para chegar à segurança financeira? Valores em média 25% superiores ao seu patrimônio na época, responderam elas.”

“As dádivas em várias formas criam laços, porque uma dádiva produz gratidão: o desejo de dar algo em retribuição, ou de dar para os outros. Uma transação monetária, ao contrário, acaba na hora em que o produto e o dinheiro trocam de mãos. Cada um vai para o seu lado.”

“Quantos filmes de aventura é preciso para compensar pela falta de aventura? Quanto entretenimento para substituir a falta de brincadeira?”

“Da nossa imersão na escassez surgem os hábitos da escassez. Da escassez de tempo nasce o hábito de andar apressado. Da escassez de dinheiro vem o hábito da ganância. Da escassez de atenção vem o hábito de se exibir. Da escassez de trabalho significativo vem o hábito da preguiça. Da escassez da aceitação incondicional vem o hábito da manipulação.”

“‘Tão longe como o horizonte e bem em frente ao seu rosto.’ Você pode correr naquela direção a vida toda, cada vez mais rápido e nunca chegar perto. Só quando para é que percebe que já estava lá. Esta é a descrição exata da nossa situação no presente. Todas as soluções para a crise global estão bem na nossa frente, mas estão invisíveis para a nossa visão coletiva, como se existissem num outro universo.”

“Não sobreviveremos como espécie lançando mão de mais da mesma coisa: espécies melhores de milho, pesticidas melhores, mais controle no nível genético e molecular. É preciso entrar numa história fundamentalmente diferente. Por isso é que o ativista, de maneira inevitável, terá que trabalhar na dimensão da história.”

“Dar atenção ao hábito enfraquece a compulsão.”

“Sem a ameaça das notas das provas, sem o cheque no final do mês, e sem o hábito internalizado do trabalho que tais recursos criaram, as pessoas não continuariam fazendo o que fazem.”

“Nós somos aquilo que comemos, e qualquer objeto de atenção torna-se um tipo de alimento.”

“Muitas pessoas não veem problema em confessar que são exigentes consigo mesmas, que são elas próprias ‘seu pior crítico’, ou que são perfeccionistas. Elas estão apenas confessando algo que nossa cultura defende como virtude: a batalha contra si mesmo.”

“Infelizmente, para a imagem de qualquer autocrítico, é impossível ser crítico de si mesmo sem ser crítico dos outros.”

“Julgamento é separação. No fundo, o julgamento diz que você escolheu de maneira diferente de mim porque você é diferente de mim. Ele diz: ‘se eu fosse você, não teria feito o que você fez’.”

“Essa é a essência da Separação: se eu estivesse na totalidade de suas circunstâncias, eu faria diferente de você. Um conjunto substancial de evidências experimentais mostra que essa afirmação é falsa: que, na verdade, se você estivesse na totalidade das circunstâncias do outro, você faria do mesmo modo que ele.”


“Debaixo do entendimento generalizado de que o problema do mundo é o mal e a solução é dominá-lo, está uma necessidade psicológica não satisfeita de autoaprovação. Dois terços do nosso discurso político tem a ver com a nossa necessidade de estar com a razão, de nos alinharmos com o Bem. Se o homem discorda de mim o faz porque ele é burro, inocente, facilmente influenciável, ou mau, então eu só posso ser inteligente, esperto, independente e bom. Tanto julgamentos positivos como negativos apontam para mim mesmo como referência tácita (preguiçoso significa ‘mais preguiçoso do que eu’, e responsável significa ‘mais responsável do que eu’).”

“O Situacionismo, diz que a totalidade da nossa situação interna e externa é que determina nossas escolhas e crenças. Em contraste, a maioria das pessoas em nossa sociedade tem a visão do Disposicionismo, que diz que as pessoas tomam decisões pelo exercício do livre arbítrio com base em disposições ou preferências relativamente estáveis. Se alguém faz uma coisa boa, diz o disposicionalista, provavelmente é porque é uma boa pessoa. O situacionista diz que não, que isso é um erro.”

“Quando uma pessoa diz uma coisa má, nosso primeiro impulso é pensar que é uma pessoa má. Podemos descobrir depois que ela estava com dor de dente, e mudar nosso julgamento, mas o primeiro impulso é fazer julgamento disposicional.”

“Não apenas nossos julgamentos pessoais, mas muitas de nossas instituições sociais - o sistema legal, em particular - baseia-se em situações disposicionistas. Presumimos que, de um modo geral, as pessoas são responsáveis por escolher suas ações e distinguem entre um ato cometido sob coação e um ato involuntariamente escolhido. Mas coação é apenas um exemplo extremo de uma influência situacional. Será que devemos ser culpados pela soma total das experiências que nos tornaram o que somos?”

“Não seria ótimo se o problema do mundo fosse realmente a ganância e maldade dos indivíduos cruéis que seguram as rédeas do poder? Nesse caso a solução seria muito simples: bastaria tirar essas pessoas do poder, fazer uma limpeza moral no mundo. No entanto isso seria mais da mesma guerra contra o mal, que nos vem acompanhando desde que as primeiras civilizações agrárias inventaram o conceito do mal.”

“Quando os dois lados de uma controvérsia se deliciam com a derrota e humilhação do oponente, de fato estão do mesmo lado: o lado da guerra.”

“A sociedade nos torna artificialmente pequenos para que caibamos em suas caixinhas, um projeto do qual nos tornamos cúmplices. Quando sentimos em demasia, quando nos importamos demais com as coisas, então os papeis que assumimos, que engraxam as engrenagens da máquina, se tornam intoleráveis.”

“O fato de existirem palavras como ingrato, tolo, idiota, mentiroso, esquisitão, imperialista, racista, e assim por diante, já é um convite à crença disposicionista de que as pessoas são essas coisas. A separação está embutida na nossa própria linguagem. É possível ver quão profundamente nosso contexto nos condiciona a enxergar o mal como fato no mundo?”

“Os seres humanos têm cometido horrores por milhares de anos em nome da luta contra o mal. A identidade do mal muda o tempo todo: os turcos! os infiéis! os banqueiros! os franceses! os judeus! os burgueses! os terroristas! - mas a mentalidade é a mesma. E a solução também: a força. Igualmente o resultado: mais mal.”

“É inútil tentar argumentar de modo racional com um homem para convencê-lo a sair de algo em que não entrou pelo raciocínio.” (frase de Jonathan Swift que abre um capítulo do livro)

“As pessoas não formam suas crenças com base em evidências e no pensamento racional. Ao contrário. Usamos o raciocínio para rearrumar as evidências de modo a criar uma história alinhada com o estado de ser subjacente, que inclui tendências emocionais, velhas feridas, padrões de relacionamento e perspectivas de vida.”

“A maneira mais direta de desmontar a História da Separação e seus fundamentos é dar a alguém uma experiência de não separação. Um ato de generosidade, perdão, atenção, verdade, ou aceitação incondicional oferece um exemplo que contradiz a visão de mundo separativa, violando pressupostos como ‘todo mundo é egoísta’, e afirmando o desejo inato de dar, criar, amar e brincar.“

“O rei do Butão trata de passar a maior parte de seu tempo nas vilas rurais. ‘Se eu ficar muito na capital’, diz ele, ‘não consigo tomar decisões sábias’. Cercado de artefatos da Separação, é provável que internalizamos a história da qual são parte.”

“Qualquer mudança em nós coincidirá com uma mudança em outras pessoas e no mundo, pois a nossa consciência não é separada da deles. Isso é totalmente diferente - na verdade, o oposto - do dogma desempoderador da separação, que afirma que não vamos conseguir a não ser que todos mudem e, portanto, o que eu ou você façamos não importa.”

“O que estou dizendo é que de fato depende de você, independente do que eu faça, e depende de mim, independente do que você faça.”


“Acabei de dizer que a Nova História está chegando à massa crítica. Mas será que já chegou? Será que chegará? Talvez não tão já. Talvez esteja balançando à beira do abismo, num momento de equilíbrio. Talvez seja necessário apenas o peso de mais uma pessoa que dê mais um passo para dentro do Interser, e isso fará pender a balança. Talvez essa pessoa seja você.”


Espero que gostem dos links.

- Tirinha do mês: desmatamento.
- Que baita entrevista essa do Emicida sobre seu novo álbum e o momento do país.
- Poder e afeto: texto do Larusso bem a ver com os trechos do livro que trouxe acima.
- Não voltaremos à normalidade, porque a normalidade era o problema.
- Se tem uma pessoa que hoje em dia está na política e conversa 100% com aquilo que acredito é a Alexandria Ocasio-Cortez. Ela foi entrevistada no SXSW e é de perder a conta a quantidade de vezes que ela foi aplaudida por uma fala. Imperdível.
- A culpa é dos imigrantes?
- Minhas últimas 3 newsletters, que foram divididas, viraram um texto só no Medium: 21 outras lições para o século XXI
, pra quem quiser ler tudo de uma vez só, ou pra quem gostou e quer compartilhar. (compartilhem até chegar no Yuval pls)
- Caiu o salário? Então bora comprar meu novo livro sobre criatividade, E se fosse diferente?, que tá só 39 pilas no site da Belas Letras, e ainda ganha outro livro para você doar para alguém!

  
Atrasei 4 dias por motivos de férias e desorganização kkkk Ninguém notou né? :)
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