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16/01/2022

Atentados contra a democracia marcam primeiras semanas do governo Lula

Política

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A semana passada pode, facilmente, ser classificada como uma das mais conturbadas das últimas décadas. No meio da organização inicial de um novo governo, atentados golpistas incendiaram Brasília, alcançando manchetes no mundo todo. Nesta edição, a Descodificado traz os principais desdobramentos desse acontecimento, as respostas das instituições e o papel da Internet nisso tudo.

A edição traz também um panorama da agenda digital no novo governo, com as estruturas de ministérios e secretarias e as indicações para os postos. O debate sobre combate à desinformação foi polêmica na criação de uma nova secretaria na Advocacia-Geral da União.

Atentados em Brasília, plataformas digitais e resposta das instituições

É difícil encontrar adjetivos para descrever os acontecimentos da semana passada. Os atentados golpistas e as depredações nos prédios dos três Poderes da República marcam a mais violenta e grave ameaça à democracia brasileira desde a redemocratização. Para além dos danos em patrimônios históricos, também chamou a atenção de especialistas o roubo de computadores e documentos que podem ferir gravemente a segurança de informações e dados sensíveis da administração pública. Confira o comentário de Caio Machado, Diretor-Executivo do Vero, sobre o assunto.

Os ataques demandaram respostas rápidas por parte das instituições. No mesmo dia, 8 de janeiro, domingo, a Presidência da República decretou intervenção federal no Distrito Federal (DF), aprovada pelo Congresso já na terça-feira, 10. Ainda no domingo, o Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afastou o governador do DF, Ibaneis Rocha, decisão confirmada pelo pleno da Suprema Corte na quarta-feira, dia 11. O STF, nesse mesmo dia, também votou por manter a prisão preventiva do ex-secretário de Segurança do DF, Anderson Torres, também ex-ministro da Justiça de Bolsonaro. Na segunda-feira, dia 9, Lula chamou reunião com os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal, além de governadores e representantes de todos os 27 entes da federação. O encontro firmou uma importante união dos líderes em torno da defesa da democracia e do rechaçamento dos acontecimentos no dia anterior. Vale destacar, por fim, também a forte onda de apoio internacional ao governo brasileiro.

Ao longo da semana e de seus desdobramentos, a pauta das plataformas digitais e de seu uso para organização dos atos bolsonaristas e para disseminação de desinformação ganharam relevância. 

A Advocacia-Geral da União (AGU) enviou, ao STF, pedido para que as plataformas de mídias e redes sociais identifiquem e removam conteúdos que promovam incitação de atos, desmonetizem perfis e transmissões de lives sobre o tema e que as empresas efetuam a guarda de registros capazes de identificar a autoria dos ilícitos praticados. Além disso, o órgão também solicitou o bloqueio de inúmeros canais e grupos do Telegram, onde foi identificado movimentos de organização dos atos.

O Ministério Público Federal abriu inquérito civil para apurar a conduta da rede Jovem Pan na disseminação de desinformação e na incitação a atos golpistas.

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, determinou a expedição de ofício ao Facebook, TikTok e Twitter para que bloqueassem canais, perfis e contas; atendeu aos pedidos feitos pela AGU de compartilhamento de registros capazes de identificar a autoria dos ilícitos; e ainda determinou a suspensão das contas nas redes sociais de três jornalistas e comentaristas ligados à Jovem Pan.

Por fim, o Ministério da Justiça apontou que irá apresentar uma série de propostas legislativas que visem à proteção do Estado Democrático de Direito. Dentre essas medidas, Dino garantiu um projeto sobre "crimes de ódio político, de terrorismo político e contra o Estado democrático de direito" cometidos na Internet.

É certo que os desdobramentos estão longe de se esgotarem. A expectativa é que, ao longo dos próximos meses, novos fatos sejam descobertos após investigações e inúmeras medidas sejam tomadas. Sem dúvida, muitas delas terão impactos significativos na agenda dos direitos digitais e da Internet no Brasil. Acompanharemos de perto aqui na Descodificado.

Governo Lula 3: panorama da agenda digital

Com o encerramento das eleições, os olhos do público se voltam agora para a composição e a organização da pauta digital no novo governo. Como noticiamos aqui na Descodificado, temas como regulação de plataformas e inclusão digital ganharam prioridade nos discursos do presidente eleito e nos trabalhos dos Grupos Técnicos de Transição.

Após os ataques em Brasília, os anúncios feitos ao longo das últimas semanas ganharam maior materialidade no grave episódio. Por isso, é importante ficar atento ao enquadramento institucional da agenda digital no novo governo:

O principal destaque é da Secretaria de Comunicação Social (SECOM). O órgão, atualmente comandado pelo Ministro Paulo Pimenta (PT-RS), voltou a estar diretamente vinculado ao Palácio do Planalto e agora abriga a Secretaria de Políticas Digitais, comandada por João Brant, ex-coordenador-geral do projeto "*desinformante". Em articulação com os Ministérios, cabe à Secretaria atuar na formulação e implementação de políticas públicas associadas “aos serviços digitais de comunicação”, à “promoção da  liberdade de expressão, do acesso à informação e de enfrentamento à desinformação e ao discurso de ódio na Internet” e à “educação e formação para o uso de serviços digitais de comunicação”, entre outras prerrogativas. Estruturalmente, ela possui dois departamentos, o Departamento de Promoção da Liberdade de Expressão e o Departamento de Direitos na Rede e Educação Midiática. Com competências abrangentes e vinculadas diretamente ao Planalto, há fortes expectativas quanto à atuação do órgão no debate sobre regulação de plataformas no país, por exemplo.

Outro destaque é o Ministério da Justiça e da Segurança Pública (MJSP), entregue ao senador eleito Flávio Dino (PSB/MA). No atual mandato, a pasta parece ter efetivamente concentrado competências quanto ao âmbito dos dados pessoais, abrigando agora a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), além de expandir sua atuação no debate penal sobre Internet. 

Além disso, ainda em dezembro do ano passado, Dino, anunciou a criação da assessoria especial de Direitos Digitais. O assunto foi falado aqui na Descodificado e a advogada Estela Aranha, já foi empossada na coordenação. Também criou-se a Secretaria de Acesso à Justiça, que será “a face de interlocução com o movimento social”, de acordo com o ministro. Dentre outras funções de democratização, a nova pasta será responsável por promover uma transformação digital no acesso à justiça, inclusive quanto às plataformas digitais. O secretário será Marivaldo Pereira, auditor federal e militante do Movimento Negro. 

O Ministério das Comunicações (MCom) também sofreu algumas mudanças. Dentre elas, a Secretaria de Radiodifusão, que passará a ser chamada de Secretaria da Comunicação Social Eletrônica. O Ministério contará com duas secretarias: a de comunicação social, que será dirigida pelo engenheiro Wilson Wellisch, e a de telecomunicações, que ficará sob controle de Maximiliano Martinhão, ex-secretário da Secretaria de Radiodifusão. Quanto às competências da Secretaria de Comunicação Eletrônica, destaca-se a promoção do pluralismo e da diversidade midiática. Outra importante mudança foi a criação do departamento de inclusão digital na Secretaria de Telecomunicações da pasta, que pretende coordenar ações e promover parcerias em busca da democratização digital.

AGU cria a Procuradoria de Defesa da Democracia

Na Advocacia-Geral da União (AGU) foi criada a Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia. De acordo com Jorge Messias, o novo Advogado-Geral da União, o órgão pretende fortalecer o trabalho das instituições e autoridades públicas, em defesa da sociedade e dos direitos individuais. Dentre as competências, o novo órgão priorizará a preservação da legitimação dos Poderes e seus membros, atuará em demandas e procedimentos que visem o enfrentamento à desinformação sobre políticas públicas e representará judicialmente a União em matéria eleitoral. 

A novidade foi alvo de polêmica. Algumas críticas  apontaram para um possível conflito com temas relacionados à liberdade de expressão e para a ausência de definição sobre o que configura “desinformação de políticas públicas”. Por outro lado, especialistas também defendem que essas atribuições já existiam, apenas passaram por uma reorganização.

Sobre o assunto, Messias anunciou que ainda haverá uma regulamentação adicional para delimitar a atuação e definir de forma objetiva o escopo, além de uma consulta pública. Ele também mensurou ser completamente possível diferenciar crítica ou informação incorreta, mas transmitida de boa-fé,  da desinformação e esclareceu que o órgão atuará sobre condutas que tenham a intenção de desinformar. 

Pautas que caminharam:

  1. A Lei nº 14.533/2023, que cria a Política Nacional de Educação Digital, foi sancionada com vetos pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Um dos vetos foi o dispositivo que incluía a educação digital como componente curricular do ensino fundamental e médio. De acordo com Lula, a inclusão de novos componentes na base curricular deve ser aprovada pelo Conselho Nacional de Educação e homologada pelo ministro da Educação. O veto será analisado pelo Congresso Nacional. 
  2. A Lei nº 14.532/2023, que tipifica a injúria racial como crime de racismo racial, foi sancionada e já está em vigor. Com a alteração, a conduta passa a  possuir pena de dois a cinco anos de reclusão. 

Sem novas proposições.

Sem agenda.